Como distinguir dos outros
O teu amor verdadeiro
Trás sandália, Trás bordão
Concha de Romeiro
Aí morreu senhora e partiu
É somente um morto
Junto aos pés tem uma pedra
Relva sobre o corpo
Canção Ofélia, Hamlet de William Shakespeare
Um titulo estranho. Uma canção do Hamlet. Um cartaz com uma peça do Chekhov. Qual será a ligação de tudo isto? (Perguntas tu.)
Varvara Mikhailovna é o nome completo da personagem Vária, da peça O Cerejal de Anton Chekhov.
Este projecto está aqui porque me trouxe novos horizontes no trabalho enquanto actriz, fez-me também superar dificuldades e deu-me também uma fantástica consciência do que eu sou enquanto represento. Trabalhámos com o actor e encenador Alexandre Pieroni Calado, e posso afirmar que até ao momento foi o projecto que mais conteúdo me deu.
O nosso trabalho foi feito à base de improvisação, algo em que até ao momento eu sempre tinha tido muitas dificuldades, e que graças a uma nova introdução do professor, fez com que tudo ficasse mais simples e claro para mim. Trabalhámos a improvisação de cenas especificas do texto de Chekhov, através de situações análogas, ou seja situações reais nossas que se podiam identificar com as sensações e objectivos da cena. Isto para mim fez com que tudo se tornasse muito mais simples e verdadeiro.
Criada a parte do esqueleto, da compreensão das personagens e do meio que as envolve, partimos para um trabalho bastante minucioso onde cada um tinha de criar a sua própria partitura de movimentação exterior e interior da personagem, com base nas marcações do encenador. Este conceito de partitura veio dos textos de Grotowski. Criámos assim as nossas próprias partituras, o que, no meu caso, me deu uma consciência espectacular de toda acção da minha personagem, cada parte do meu corpo tinha uma partitura para cada momento em que eu estava em cena e consequentemente o meu sub-texto fazia parte da partitura.
«Qualquer artista concorda que há um momento em que existe uma ligação com algo superior ao nosso próprio entendimento.»
Gustavo Santaolalla
Acontece que esta ligação aconteceu comigo, com esta peça, com esta personagem, com este trabalho, e é por isso que ele foi tão importante para mim. Somos sempre seres em constante actualização e mudança, vamos mudando e encontrando as nossas próprias ferramentas de trabalho e compreendendo como podemos melhorar. O processo não foi fácil, mas quando acabou compreendi o valor e importância que teve para mim enquanto futura actriz. Nem sempre, ou quase sempre, o resultado final consegue demonstrar o que fica connosco. Isto foi parte do que ficou comigo. É longo e extenso. Mas é importante para mim. Foi importante para mim. E é por isso que está aqui.
Só podemos ser outro sendo nós próprios, aceitando-nos, conhecendo-nos, confiando em nós, e desligando-nos da frequente obsessão de "o que é que os outros estão a pensar de mim?".
A magia acontece quando saímos do lado de lá da linha, da bolha, da consciência, do conforto. Sejas tu actor, pintor, canalizador...
Eu fui Vária. Eu fui Carolina. Eu fui Varvara Mikhailovna. Eu sou eu. Quem és tu?
Fotografia: Sofia Ribas |
Uma Didascália
por Carolina
0 comentários:
Enviar um comentário