Sinto na minha cabeça a velocidade do giro da terra,
E todos os países e todas as pessoas giram dentro de mim,
Centrífuga ânsia, raiva de ir por os ares até aos astros
Bate pancadas de encontro ao interior do meu crânio,
Põe-me alfinetes vendados por toda a consciência do meu corpo,
Faz-me levantar-me mil vezes e dirigir-me para o Abstracto,
Para o incontrolável, Ali sem restrições nenhumas,
A Meta invisível todos os pontos onde eu não estou, e ao mesmo tempo...
Ah, não estar parado nem a andar,
Não estar deitado nem de pé,
Nem acordado nem a dormir,
Nem aqui nem noutro ponto qualquer,
Resolver a equação desta inquietação prolixa,
Saber onde estar para poder estar em toda a parte,
Saber onde deitar-me para estar a passear por todas as ruas,
Saber onde...
Passagem das Horas, Álvaro de Campos
(Heterónimo de Fernando Pessoa)
Também não vou falar do que correu mal, nem do que correu bem.
Vou falar do que me marcou.
Vou falar de Álvaro de Campos.
Vou falar da vida, da rotina, do desespero, da perda, do vazio, do sentido, do fim.
Ironia ou não, o excerto com que se inicia esta publicação pertence a um texto que se intitula de Passagem das Horas, ora se vos disser que desde que começou até que acabou eu desejei com todas as minhas forças que tudo acabasse muito rápido, talvez fiquem com uma ideia de como a passagem das horas, dos minutos e dos segundos foi complicada e demorada para mim.
Andei perdida a grande maioria do tempo e dei tudo o que podia de mim para me conseguir agarrar ao projecto, eu literalmente estava disposta a vender a minha alma ao diabo para conseguir sobreviver lúcida a todo o processo.
Tudo parecia para mim um grande burrão, o avança e não avança, a falta de motivação, o não conseguir compreender, as constantes mudanças, o cansaço, o desespero, a máquina.
A M-Á-Q-U-I-N-A, o sentimento de ser uma máquina, a triste vivência do dia-a-dia. A consciencialização do quão máquinas nós somos, nas mãos dos outros e nas nossas próprias mãos.
Quando se pega em Fernando Pessoa e nos seus heterónimos, damos sempre de caras com a dura realidade das sensações. O que ele nos diz é tão cru, tão real, tão estrangulador, tão igual a nós que chega a causar dor.
Nós vivemos todos as passagens de Álvaro de Campos, todos éramos Álvaro, e todos nos identificávamos de alguma forma com o que ele nos diz, e isso foi talvez a melhor coisa que o projecto nos deu.
Confesso que não sei quantas vezes "morri" neste projecto, nem quantas vezes fui obrigada a "sobreviver", talvez este projecto tenha sido um pouco do que Álvaro de Campos sentiu tantas vezes na sua existência, talvez nós, sem nos apercebermos, tenhamos passado pelas mesmas fases que ele passou, e talvez tenha sido isso que fez com que o sentimento de vitória final tenha sido maior do que o esperado.
Fomos Decadentes. Sentimos o tédio, o enfado, o cansaço, a náusea, o abatimento, a necessidade de novas sensações.
Fomos Futuristas/Sensacionistas. Celebrámos as máquinas, a energia mecânica, a civilização moderna. Fomos poluídos fisicamente e mentalmente pela vida moderna. Transgredimos as leis, vivemos o excesso de sensações.
Fomos pessimistas. Ficámos cansados, sentimos-nos vazios, abatidos, incompreendidos, frustrados, revoltados, desiludidos, nostálgicos, sozinhos.
(Acreditem, ironia ou não, isto tudo aconteceu de alguma forma.)
E apesar de tudo isto estar a parecer dolorosamente complicado, no fim, ficou um vazio. Quando tudo terminou, parecia que me tinham arrancado parte de mim, como se afinal não tivesse sido assim tão mau, ou como se mesmo quando as coisas não são tão boas como gostaríamos, se nos entregarmos e dermos de nós, elas vão ter sempre alguma coisa nossa, e é por isso que
«Tudo vale a pena
Se a alma não é pequena.
Quem quer passar o Bojador
Tem que passar além da dor.
Deus ao mar o perigo e o abismo deu,
Mas nele é que espelhou o céu.»
(Fernando Pessoa)
Quando te sentires prestes a desistir, se neste momento quiseres desistir, lembra-te que há sempre alguma coisa que podemos levar connosco nas experiências que ultrapassamos, nada é totalmente mau, mesmo que pareça dolorosamente difícil, tu consegues, tu aguentas, e vais sentir no fim que valeu a pena. Porque na vida nada vem de forma simples, e estamos sempre a ser postos à prova, caso contrário, não estaríamos a viver, estaríamos apenas a existir.
Deixo-vos uma imagem do meu mapa intensivo deste projecto, se não perceberem o que é, não faz mal, eu também não sei bem o que me deu para ser tão eu.
Uma Didascália
por Carolina
Quando se pega em Fernando Pessoa e nos seus heterónimos, damos sempre de caras com a dura realidade das sensações. O que ele nos diz é tão cru, tão real, tão estrangulador, tão igual a nós que chega a causar dor.
Nós vivemos todos as passagens de Álvaro de Campos, todos éramos Álvaro, e todos nos identificávamos de alguma forma com o que ele nos diz, e isso foi talvez a melhor coisa que o projecto nos deu.
Confesso que não sei quantas vezes "morri" neste projecto, nem quantas vezes fui obrigada a "sobreviver", talvez este projecto tenha sido um pouco do que Álvaro de Campos sentiu tantas vezes na sua existência, talvez nós, sem nos apercebermos, tenhamos passado pelas mesmas fases que ele passou, e talvez tenha sido isso que fez com que o sentimento de vitória final tenha sido maior do que o esperado.
Fomos Decadentes. Sentimos o tédio, o enfado, o cansaço, a náusea, o abatimento, a necessidade de novas sensações.
Fomos Futuristas/Sensacionistas. Celebrámos as máquinas, a energia mecânica, a civilização moderna. Fomos poluídos fisicamente e mentalmente pela vida moderna. Transgredimos as leis, vivemos o excesso de sensações.
Fomos pessimistas. Ficámos cansados, sentimos-nos vazios, abatidos, incompreendidos, frustrados, revoltados, desiludidos, nostálgicos, sozinhos.
(Acreditem, ironia ou não, isto tudo aconteceu de alguma forma.)
E apesar de tudo isto estar a parecer dolorosamente complicado, no fim, ficou um vazio. Quando tudo terminou, parecia que me tinham arrancado parte de mim, como se afinal não tivesse sido assim tão mau, ou como se mesmo quando as coisas não são tão boas como gostaríamos, se nos entregarmos e dermos de nós, elas vão ter sempre alguma coisa nossa, e é por isso que
«Tudo vale a pena
Se a alma não é pequena.
Quem quer passar o Bojador
Tem que passar além da dor.
Deus ao mar o perigo e o abismo deu,
Mas nele é que espelhou o céu.»
(Fernando Pessoa)
Quando te sentires prestes a desistir, se neste momento quiseres desistir, lembra-te que há sempre alguma coisa que podemos levar connosco nas experiências que ultrapassamos, nada é totalmente mau, mesmo que pareça dolorosamente difícil, tu consegues, tu aguentas, e vais sentir no fim que valeu a pena. Porque na vida nada vem de forma simples, e estamos sempre a ser postos à prova, caso contrário, não estaríamos a viver, estaríamos apenas a existir.
Deixo-vos uma imagem do meu mapa intensivo deste projecto, se não perceberem o que é, não faz mal, eu também não sei bem o que me deu para ser tão eu.
«Perco-me todo de mim, já não vos pertenço, sou vós.»
Uma Didascália
por Carolina
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